VIRANDO O JOGO
POR SIMONE GALIB
A Copa do Mundo começa em meio a uma chuvarada de críticas, temores, greves e indignação. Mas precisamos juntar os cacos das nossas desilusões,
arejar a casa e receber bem os turistas. Esporte é alegria, é adrenalina, é
união. E o mundial, um grande evento. O restante? Decidimos nas urnas!
Ando injuriada com
tudo o que vem acontecendo no Brasil e especialmente pela forma com que todos
começaram a criticar o país. São tantas notícias ruins em tempo integral, um descaso
total com os nossos problemas do dia a dia, que não são poucos, uma inabilidade
completa por parte dos governantes, que merecidamente perderam o respeito dos cidadãos,
milhares deles seus próprios eleitores, além da onda de greves que me parecem
totalmente oportunistas, embora as reivindicações das categorias sejam justas.
Sem contar com as mídias sociais, que viraram um gigante portal de
descontentamento, de desabafos e de piadas. Rimos e debochamos o tempo inteiro
da nossa própria desgraça. Falamos mal de nós mesmos. O brasileiro, famoso por
ser amável e cordial, está amargurado, cansado. Para onde caminhamos? Parece
que o país está navegando em direção a um iceberg, pronto para naufragar, ou se
mantém frente a um vulcão, que vai explodir a qualquer momento, com
consequências imprevisíveis.
A Copa do Mundo, um
dos mais poderosos e cobiçados eventos esportivos do planeta, chegou a nossa
casa, mas continuamos desconfortáveis, incomodados, irritados. Mostramo-nos receosos
em vestir o verde-amarelo; estamos indignados com tamanho amadorismo e
indisciplina no país sede. Sentimos vergonha de mostrar ao mundo todas as
nossas feridas e do que possa a vir a acontecer no decorrer do campeonato. Muitos
chegam ao ponto de torcer para que a seleção brasileira perca o mundial para
não favorecer os políticos que, na minha opinião, devem ser julgados e
condenados nas urnas –e não nos estádios que, aliás, custaram uma
fortuna!
Esporte é alegria, é adrenalina, é união. Não pode ser jogado nesse caldeirão
de interesses escusos.
O país do futebol
sente frio na barriga, insegurança, indignação, revolta, quer vestir luto e até
torce para que não venham muitos estrangeiros gastar seus dólares ou euros
aqui. Se estamos assim, como devem estar se sentindo os estrangeiros que já começam
a desembarcar? Fico imaginando o temor que lhes assola diante dessa avalanche
de desgraças, de crimes, de violências, da falta de serviços eficientes, das
obras inacabadas, veiculados pela mídia e particularmente pela internet, na
velocidade da luz. São aconselhados por suas embaixadas e pela própria Fifa a
tomarem cuidado com absolutamente tudo, afinal estarão visitando um país que exala
um clima de “guerra” urbana.
XÔ, BAIXO ASTRAL!
Essa energia de
desalento, de falta de perspectivas e de medo vai tomando conta de tudo. É um
baixo astral que contamina. Eu, particularmente, temo pela integridade física e
moral dos turistas e torcedores. E também torço antecipadamente para que não
sejam assaltados, assassinados, violentados e colocados em situações
constrangedoras, retornando aos seus países sãos e salvos. Explorados eles já
serão naturalmente, assim como nós o somos todos os dias, a partir do momento
em que saírem do avião, porque estarão pisando o solo do país com os preços e
os impostos mais extorsivos do mundo.
Não sou a favor da forma como o governo conduziu a
realização da Copa do Mundo: super faturamento, gastos excessivos e abusivos,
incompetência para gerenciar, realizar e concluir as obras, além da utilização
de recursos que poderiam ter sido utilizados para resolver os problemas do
país, que são milhares, entre outros fatores. Mas, quando foi anunciado, lá
atrás, que seríamos a sede houve comoção geral e explosão de alegria. Claro que
sabíamos que o quadro que vivemos hoje seria praticamente inevitável.
Conhecemos o país, afinal. Mesmo assim, comemoramos, nos alegramos. Tivemos
esperanças de dar um salto, de gerar empregos e de transformar o Brasil em uma
vitrine para o mundo, de forma positiva. Sonhamos e nos permitimos ser
enganados, mais uma vez.
BONS ANFITRIÕES
Além disso, a realização dos megaeventos esportivos, Copa e
Olimpíadas, em 2016, trouxe um fôlego novo. Investidores passaram a olhar para
o Brasil com maior interesse, marcas estrangeiras se apressaram em abrir
filiais aqui, a rede hoteleira começou a se aquecer, milhares de empresários e
profissionais se prepararam e uma infinidade de bons negócios se desenhou no
horizonte. Bem administrada e tratada com profissionalismo, a Copa do Mundo é,
sim, um excelente negócio. E o Brasil tem belezas e qualidades únicas. Por que
não explorar o que é bom, o que funciona, o que temos de melhor como fazem os
outros países? Por que não sermos anfitriões gentis e civilizados? Não gostamos
de nos sentir acolhidos e respeitados quando viajamos ao exterior?
Portanto, não adianta
esbravejar, queimar a bandeira, organizar protestos, de quórum inexpressivo,
que só tumultuam a vida das pessoas e depredam o patrimônio público. É uma
atitude sem sentido, sem cidadania e sem educação, que interessa a poucos e
mostra a infantilidade de um povo que detona a sua própria casa na frente das
visitas. O que precisamos fazer é juntar os cacos de nossas desilusões,
respirar fundo e transformar toda essa energia negativa em alguns momentos de
alegria. Podemos comemorar o gol, sim, vibrar, torcer pela seleção brasileira, como
sempre fizemos exaustiva e festivamente à distância. O país está precisando de
mais alegria, dessa boa vibração. Afinal, todo o dinheiro já foi investido, não
será devolvido, a Copa do Mundo é uma realidade e as seleções e
os torcedores não têm culpa de nada. Guardemos os nossos grandes protestos, e
toda essa indignação, para outubro, a primavera das eleições, quando
legitimamente, e por intermédio das urnas, poderemos mandar de volta para a
casa todos esses políticos que nos roubaram a alegria, o orgulho de ser brasileiros
e dizer, de peito aberto e num coro cidadão: “Agora chega. O jogo acabou!
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